Nos últimos dias, a imprensa fez notícias com as quotas da música portuguesa nas rádios (deixo aqui um link para quem quiser ler). Mas rapidamente explico a questão:
Durante a pandemia, e como uma medida de emergência, o ministério da Cultura aumentou a quota de música portuguesa nas rádios de 25% para 30% para que os artistas ganhassem mais algum dinheiro através dos direitos de autor, pois tinham deixado de ganhar através de concertos. Mas também porque correspondia a uma atualização da quota que não era atualizada há mais de 10 anos.
Mas, agora, essa decisão foi revogada e por isso a quota de música portuguesa nas rádios desceu novamente para 25%.
Eu sei que é uma questão que a maioria das pessoas que ouve rádio nem deve dar conta, e provavelmente até pode acreditar que essas quotas são cumpridas e até ultrapassadas. Na realidade, tirando as rádios públicas (Antena 1 e Antena 3 que inclusivamente tem outras regras, 70% e 50% de quotas), as rádios privadas locais e nacionais cumprem no limite as quotas. Segundo dados da ERC, em 2021 quando o limite estava nos 30%, as rádios privadas cumpriram 31%.
E qual a importância das quotas? Não se devia escolher o que se ouve pela qualidade?
Bem… Se deviamos escolher pela “qualidade” (sim, coloquei entre aspas), eu digo que é tudo muito relativo. Na arte, a qualidade é uma medida subjectiva. Já escrevi aqui sobre o equilibrio de forças entre a música pop e os restantes géneros, inclusive sobre a dita música clássica. Como se mede a qualidade? Não se mede. O gosto de cada um não é indicador de qualidade 🙂
Mas as rádios privadas como a Rádio Comercial ou a Rádio Renascença tem ou deve de passar a música X ou Y?
Na realidade, quem manda nas estações privadas são as próprias organizações. Dentro das quotas de música portuguesa, a Comercial tem liberdade para escolher tocar a Carolina Deslandes, Miguel Araújo ou a Ana Moura. E inclusivamente decide não tocar outros artistas portugueses como o Filipe Sambado, Dino D’Santiago ou os Capitão Fausto (como aconteceu, aqui está a notícia).
E porquê é importante ter quotas?
Pela Europa fora, existem quotas para o talento nacional, desde a música ao cinema, incentivando a criação e divulgação. Em França por exemplo, a quota atual é de 40%. E esta aposta é importante pois dá espaço a artistas com menos projecção (e muitas vezes menos meios financeiros) de chegar às pessoas. O universo da música é muito centrado no eixo anglo-saxónico (EUA e Inglaterra). São as duas grandes potências que dominam a história da música nos últimos 200 anos (?!).
Ainda por cima, os seres humanos são animais de hábitos. A grande maioria das pessoas tem dificuldade em ouvir músicas novas, e que não identifica. Eu conheço muitas pessoas que não ouvem para além das músicas que ouviam na adolescência ou jovem adulto. Ainda há pouco tempo num jantar alguém dizia que tinha deixado de ouvir música nova nos anos 00 (e era alguém que ainda não tem 40 anos).
Mas há outro factor nas quotas que se fala pouco. As quotas estão divididas em duas. Música portuguesa no geral e depois nova música portuguesa. Onde é obrigatório incluir artistas editados há menos de um ano. E isto é absolutamente essencial para criar novos músicos, e novos públicos.
O título deste post é uma piscadela de olho a este lado, a necessidade de nova música portuguesa. É necessário dar espaço para se ouvir “os próximos Xutos, os próximos GNR, a próxima Amália ou a próxima Lena D’Água”.
Podia ficar aqui bastante tempo a escrever sobre isto, mas aproveito para deixar aqui o link para a petição pública a pedir o aumento novamente da quota para os 30%. Eu já assinei.
